quinta-feira, 29 de março de 2012

Conto - Da Chegada do Feiticeiro

Naquela época de Produção Textual I, eu reciclava o que podia de textos antigos. Era muita coisa pra escrever e reescrever, além de conciliar com outras cadeiras. Desta vez era para escrever um conto. Conto me lembra narrativa, que me lembra narrador, que me lembra storyteller, que por sua vez, me lembra RPG. Catei meus históricos de personagem e foi esse texto mesmo... E bah, eu reciclei o Krion. Acho que já comecei umas três aventuras com ele, e o coitado mal chegou ao nível três em cada uma =(






Da Chegada do Feiticeiro

Despertando de súbito de seu transe por um trovão, Aurindë levanta. Resolve verificar se tudo está bem em sua casa, pois tem uma estranha sensação a incomodando. No quarto de Silmelokë, encontra-o vazio. “Mas o que...?” Um relâmpago ilumina o quarto, chamando a atenção dela para um livro entreaberto, com as páginas sendo viradas pelo vento. Ela posiciona na última página escrita, cujas letras ainda estão úmidas pela tinta, e começa a ler.
"Meu nome é Gwythyr, Feiticeiro de Batalha da Divisão Glacial do Exército Imperial de Draconnia. Minha unidade, Suspiro Gelado, tem por missão rastrear da maneira mais discreta possível o Homem de Preto, que fez refém o filho do Imperador de Draconnia.
Seguimos alguns boatos a respeito deste que é um dos maiores mercenários conhecidos sobre seu paradeiro, e acabamos perto de uma Mina Abandonada. Afinal, por que ele está metido nisso? Quem o teria contratado? É certo que ele só pega trabalhos que o agradam, e só os mais lucrativos e vis. Inúmeras vezes escapou da lei. E por que deixou que se soubesse que ele realizou o sequestro? Por que ainda não pediu o resgate? Tudo muito estranho. Resolvemos entrar furtivamente na mina para investigar.
Alguns momentos depois, localizamos a Legião dos Perdidos, ou parte dela. Um grupo, ou melhor, um exército feito da escória do mundo. Dizem que seu fundador reuniu alguns mercenários e guerreiros perdidos da última grande guerra para formar sua própria milícia, a fim de vingar-se de alguns Generais que o haviam destratado. Na mina, pude ver três dos seus principais comandantes, sendo que dois deles deveriam estar mortos! Talvez estejam...
Estavam conversando com outras três pessoas. Uma delas vestia-se de negro, com uma armadura que parecia feita de ossos. Um General dos Batalhões do Medo! O segundo, vestido com uma armadura completa de aço escurecido e correntes negras. Um dos Comandantes da Milícia de Metal. Não há dúvidas! O que está acontecendo é terrível! Draconnia deve saber disso tudo! Quase gritei, quando minha atenção foi desviada para o terceiro homem. Vestido somente com uma túnica negra, repleta de bordados arcanos dourados, parecia emanar uma aura maligna, pois o solo ao seu redor estava morto. Olhava para mim ao mesmo tempo em que conversava com o restante do fatídico grupo. Temos que avisar a Capital! À medida que fomos nos esgueirando para a saída, foi dado o alarme. Fomos pegos! Agora não temos escolha se não lutar.
O que se seguiu não foi uma luta, e sim um massacre. Vi dois de meus companheiros morrerem. Em meio à luta, vislumbrei o que parecia ser o homem de preto. Ele me olhava no fundo da alma. Parecia que só havíamos nós naquela hora. Ninguém me atacava, por mais feroz que estivesse o embate. Eu tampouco vi alguém por perto. Seu olhar era de desafio. Ele entra numa fenda na parede. Minha honra não deixara passar esse desafio em branco. Segui-o.
O caminho era tortuoso e subia muito. A luz da lua indicava o fim da trilha. Parecia ser o topo da mina, um local inóspito e estéril, cheio de pedregulhos. Praticamente um deserto. Procurei pelo meu adversário em vão, não parecia estar em nenhum local próximo. Neste momento, já me esquecera de que meus companheiros estavam lutando por suas vidas, e que eu deveria ajudá-los. Deviam ter sido feito prisioneiros ou mortos. O eclipse chega a seu ápice.
"Bem vindo às minhas terras, tu serás amaldiçoado!"
Ditas essas maldições, vejo o Homem de Preto em pé numa elevação próxima. Sentadas próximas a ele, estão uma mulher e uma criança. Não pode ser! Elas? Ele as liberta, e elas vêm em minha direção. Ergue seus braços e uma tempestade de fogo, fumaça e areia surge por detrás de seu manto em nossa direção. Elas são dilaceradas. A tempestade chega a mim, a última coisa que lembro é a risada maligna do Homem de Preto e a Torre Negra iluminada pelo eclipse.
Achei que havia morrido. Mais tarde contaram-me que fui encontrado parcialmente em chamas, em meio à neve. Acordei em uma espécie de prisão, junto com um Elfo que também não estava muito bem. Eu estava muito ferido, havia queimaduras por todo meu corpo. Não tardaria a morrer. E de fato, morri. É uma sensação esquisita, o meio termo. Foi quando ouvi uma voz.
"Você ainda tem muito que fazer".
Nesse instante toda a luz que havia onde eu estava se torcia e contorcia. Acordo de súbito. Vejo o Elfo ao meu lado, por entre as grades ele mantém a mão direita no meu peito. Na esquerda, segura uma flauta. No momento em que levanto, ele cai. Chamo por ele em vão, pois ele já jaz morto no chão. Vi corpos demais para ter dúvidas. O feitiço de cura que ele me aplicou não me curou totalmente, mas pelo menos eu iria sobreviver. Em memória daquele que me salvou, tomo sua flauta. Nunca soube o nome dele.
Posteriormente, fui levado a um templo, para que me restaurasse. Eu havia sido salvo pelos Eladrins, parentes distantes dos Elfos. Até então eu não tinha percebido que estava em um mundo completamente diferente do meu. Aurindë, a Eladrin que me acolheu, disse que era um evento auspicioso a minha chegada. Por isso não tinham me eliminado. Ela me recebeu em sua casa, para saber tudo o que acontecera. Nunca um filho de Bahamut havia aparecido desta maneira por lá.
Foi só neste momento que percebi que estava em um mundo completamente diferente do meu. Meu vasto conhecimento das montanhas e vales de Draconnia nada adiantou. Até mesmo meus idiomas eles não entendiam. Meus poderes haviam mudado, meu corpo mudara. Perdi minhas asas, minha cauda, fiquei maior, mais jovem. Parecia não passar dos quinze anos. Estudei as línguas deste mundo e em breve fui capaz de me comunicar com o restante dos cidadãos. Embora Aurindë tenha me dado um nome, Silmelokë Ninquemorion, que significa Dragão Prateado, Filho das Neves Noturnas, o povo quase sempre me chamava de Lokerion, Filho do Dragão. Muito criativos esses elfos e seus nomes. Mas acabei me acostumando somente com Krion, que é como um Clérigo, chamado Heskan, me chamava. Ele disse que soava mais dracônico, embora fiel ao que me chamavam. Havia sido chamado por Aurindë para auxiliar nos meus estudos onde ela não podia ajudar muito, sobre Dragões e outros planos.
Heskan me apresentou a quem me encontrara em meio à neve. O'tellan Tur. Um jovem meio-elfo muito curioso. Junto dele e de Heskan, pude praticar a linguagem dos elfos deste mundo, assim como a dos Dragões. Estranhamente O'tellan também sabia dracônico, o que colaborou nos treinos. Sempre que podia ele ia ao templo para conversar conosco. Afinal, não podia falar dracônico com mais ninguém.
Certo dia, enquanto tentava recobrar a lembrança da minha magia, O'tellan me viu lançar chamas pelas mãos. Seus olhos brilhavam. Insistiu para que eu o ensinasse. Não bastaram os meus avisos e de Heskan de que se tratava de uma habilidade do sangue. Imitava-me em meus gestos e palavras, numa vã tentativa de copiar-me. Ou se nasce com o dom ou não. Até que em uma das vezes em que o dispensava em meio ao fogo pra ver se aprendia, vejo uma pálida chama em sua palma. Ele conseguiu. Passou a praticar comigo, mas nunca me alcançou. Ele tem talento, mas ainda não é seu negócio.
À medida que os meses iam passando, meu treinamento ia se tornando mais desnecessário, pois já estava totalmente recuperado. Pelo menos fisicamente, pois tenho que reaprender todas as minhas magias. Urge em mim uma necessidade de conhecimento que não pode ser saciada nesta cidade. Aqui é um local que depende exclusivamente do comércio entre cidades vizinhas, como uma espécie de posto avançado em meio à natureza hostil. Preciso aprender sobre Planos e Viagens do tipo, pois tenho que voltar. Essa vontade cresce a cada dia. Descobri que pouco a pouco estou perdendo a minha memória do meu lar. Meu outro nome e títulos agora pouco importam. Devo me apressar.
Esta é a última anotação que faço neste diário, uma lembrança do que aconteceu de mais importante desde que cheguei. Diário que deixo nas tuas mãos, pois esta noite, parto na minha busca. Já não me importa mais se a Marcha do Tempo já começou e Draconnia tem seus dias contados, assim como o príncipe. Tenho que descobrir o que aconteceu com meus companheiros e com elas. Namarië, Aurindë, Heskan. Perdoem-me se parto sem dizer adeus, mas voltarei antes do fim. Se o Homem de Preto e sua Torre Negra estão neste mundo, irei encontrá-los, custe o que custar. Namarië, Aurindë, namarië."
Ela fecha o livro e dirige-se até a janela escancarada. Olhando um vulto que se afasta nas trevas e se une a outro, ela se despede: “Namarië, Silmelokë. Que tu possas encontrar tua senda e o caminho de regresso.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário